32.Família Parte II

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O quarto de Sofia estava escuro, as luzes apagadas no apartamento indicavam que o avô estava dormindo e que Aghi e Miguel ainda não voltaram do encontro com Isabel e a banda do primo.

Não parecia certo, normalmente o irmão chegava antes das vinte e três horas e o relógio já se aproximava da meia-noite. O hábito de esperar o irmão estava mais complicado ultimamente, principalmente quando estava acompanhado de seu mais novo amigo, Aghi. Os dois estavam sempre juntos cochichando algo, e quando Sofia se aproximava Miguel mudava repentinamente de assunto, sempre se indagava que tipo de mistérios os dois guardariam.

Sentia um pouco de ciúmes do irmão, mas adorava Aghi e não queria atrapalhar a rara oportunidade de ver seu irmão, sempre tão desanimado, ter uma amizade.

Ela optou por esperá-los em vão, sucumbiu ao sono enquanto usava a frágil luz de seu celular para jogar um dos vários e repetidos jogos de sua loja de aplicativos, um hábito que se tornou rotina em seu dia. Rotina essa que consistia em estudar e mandar mensagens para suas poucas amigas, aquelas que ainda se importavam com a garota que não podia sair de casa.

Acordou sobressaltada com um barulho de trovão, ela odiava a inconsistência de barulhos altos que a chuva traz. Estava suada, teve um pesadelo, mas não saberia dizer o que era. Esfregava os olhos enquanto tentava se adaptar com a escuridão do quarto, deu uma olhada no celular para perceber que já passara da meia-noite, talvez o irmão tivesse chegado e não quis incomodá-la.

Não, ele não chegou, a garota pensou. de alguma forma ela sempre sabia quando o irmão estava próximo, era estranho, mas ela sabia. Talvez mandar mais uma mensagem fosse a única alternativa válida, enquanto digitava foi pega de surpresa por mais um estrondo, quando ergueu os olhos em direção a janela percebeu uma silhueta parada do lado de fora, próxima ao vidro.

Seu coração disparou, as mãos geladas e os dedos trêmulos tentavam agarrar o cobertor em desespero, algo estava lá fora. Sem o clarão do raio tudo estava escuro lá fora, pensou que seu medo exagerado a estava pegando com alguma peça sem graça. Como um ladrão subiria até seu andar em uma noite de chuva? Ela concluía ser impossível.

Levantou-se e começou a se esgueirar em direção a janela, tateava os móveis para não tropeçar em algo, precisava verificar, tinha que ser corajosa e saber o que era aquilo. Parou em frente a janela, embora não enxergasse nada, sabia que algo realmente estava parado ali. Apertou o celular com força pensando que se algo estivesse do outro lado, pelo menos poderia avisar o irmão.

Então, novamente a luz tomou o quarto, e ela viu algo impossível, não podia fazer sentido. Foi muito rápido, mas aquilo era uma pessoa, uma mulher. Não conseguiu ver o rosto, mas a silhueta era assombrosamente familiar. Enquanto pensava viver um sonho escutou uma voz ecoar em sua cabeça, doce, pura e deliciosamente aconchegante:

— Querida, você cresceu tanto, que mulher linda você vai ser.

Seus olhos deram lugar a toda perplexidade de sua vida, a familiaridade não era em vão, aquela voz doce pertencia a sua falecida mãe. Aquela mulher era sua mãe. Não podia ser, mas tinha que ser. Ela agarrou o batente da janela para não cair no chão, tentava desesperadamente balbuciar algo mas não podia.

— Sou eu, meu amor. É a mamãe, estou aqui novamente pra você. Me desculpe por tudo que você passou. — A voz chegava com um conforto, como se a mulher do outro lado estivesse sussurrando em seu ouvido, mas não conseguia enxergar o rosto. — Essa noite ficaremos juntas como família, e dessa vez vai ser pra sempre.

Precisava desesperadamente abraçá-la, algo naquela voz era hipnotizante, era como o canto de uma sereia. Abriu a janela enquanto a mão tremia desesperada,debruçou-se para fora, e o que viu foi aquele corpo, que flutuava mais de oito metros na frente da sua janela, era como um anjo, mas a face era tomada por uma sombra.

— Se você quiser pode me abraçar querida, pode vir até aqui e me abraçar. Me dê sua mão, meu amor.

Sua mãe estava ali estendendo a mão a menos de um metro da janela, era próximo, muito próximo. Deus, como eu quero abraçá-la, pensou Sofia. Colocou a coxa direita para escalar a parede, a água molhava o chão do quarto, e a janela estava escorregadia, era perigoso. Esticou a mão na direção de sua mãe.

— Só mais um pouco, Sofia. Só mais um pouco e ficaremos juntas.

Estava difícil se segurar, os dedos tocavam levemente a palma da mão dela, alcançaria sua mãe e não largaria nunca mais. Seu celular largado no chão, começou a vibrar, e depois a tocar. Aquilo a chamou de volta para realidade, estava com medo de cair e voltou rapidamente caindo para dentro do quarto.

O celular parou de tocar, olhou para fora e a mãe ainda estava lá. Precisava falar, precisava dizer eu te amo uma última vez. Lutava contra suas cordas vocais desesperadamente para balbuciar algo, mas o melhor que conseguiu foi "mã". Tentou pegar seu quadro de recados na beira da cama e enquanto escrevia foi interrompida pela voz aconchegante.

­— Meu amor, eu preciso ir. Mas você sabe onde me encontrar, não sabe? Você sabe que meu corpo descansa próximo daqui.

Pensou em balançar a cabeça negativamente. Mãe, eu não consigo nem sair de casa. Você tá mesmo me pedindo pra ir até um cemitério? Ela pensava desesperadamente.

No entanto acenou positivamente, enquanto uma lágrima escorria pelo olho direito. Aquela voz, como dizer não para aquilo. Ela enfrentaria todos os seus medos para vê-la novamente. Tudo que passou seria esquecido, poderia ser uma filha, crescer e se tornar a mulher forte que a mãe sonhava.

— O Miguel, ele sabe que vai me encontrar, nós três juntos novamente. Dessa vez nada vai nos separar, nada. ­Vai ser agora filha, mas você precisa correr.

A voz desaparecia, e o corpo da mãe sumia como fumaça no meio da chuva. Em um instante nada podia ser visto, apenas a chuva e a lua estavam lá fora.

A mãe desapareceu, não tem problema, ela sabia que podia encontrá-la. Precisava.

 Precisava

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Essa foi forte, heim?

Obrigado pela leitura, te vejo em breve!

Aquele abraço!

****PRÓXIMO CAPITULO  28/04****

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