50. Miguel

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Miguel sabia que a vida não favorecia todos, principalmente sua família: a morte da mãe de forma trágica, a doença do pai, da irmã e do avô, era quase o universo se esforçando para dificultar a estadia deles, neste mundo

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Miguel sabia que a vida não favorecia todos, principalmente sua família: a morte da mãe de forma trágica, a doença do pai, da irmã e do avô, era quase o universo se esforçando para dificultar a estadia deles, neste mundo.

Contudo, sempre se sentiu um privilegiado, ao contrário dos outros membros de sua família, sempre teve uma saúde de ferro e disposição para todas as tarefas diárias, era incrível como ele se desdobrava para cuidar das pessoas que amava e dos afazeres individuais como escola e trabalho.

Nos últimos meses não contou com essa disposição, seu corpo estava sempre exausto, seu humor no limite e a força, apesar de todo o poder descoberto na noite do beco, parecia esvanecer gradualmente. A dedução foi rápida:

Ele estava morrendo.

Com a ajuda de Aghi aprendeu a invocar sua corrente espiritual e a analisava todos os dias: aquele arco de energia girava cada vez mais devagar por seu corpo e as rachaduras que o envolviam estavam maiores, e claro, o que mais lhe assustava era a cor acinzentada.

Lembrou da explicação de Arae o Mestiço, a cor cinza que tomava os tons de azul indicavam uma tendência violenta, ou "gosto por violência" como definiu a própria criatura. De fato, ele sentia falta de enfrentar os Carniçais e do sangue e brutalidade que aqueles conflitos exigiam.

Seu corpo estava reagindo de forma ainda pior, reconheceu sintomas de abstinência como suas mudanças súbitas de humor, aumento de ansiedade, falta de sono e tremores sem explicação. Questionava se sua alma estava tão afetada por isso ao ponto de refletir em sua saúde, contudo, em sua análise chegou a outra conclusão: não eram sintomas de abstinência, aquilo era o corpo separando-se do espirito.

No outro mundo a misteriosa mulher o alertou que ele morreria três vezes, ou melhor, conheceria a morte três vezes, uma é certa que já aconteceu em seu conflito com o Carniçal Glutão no beco. Na certa a segunda estava próxima, sentia um mal-estar inacreditável crescendo a cada dia e não sabia quanto tempo aquilo podia durar.

Seu trabalho estava sendo afetado, não sua eficácia, mas sim sua interação com os outros. Nem mesmo Emílio, seu gerente, tão afoito por importuná-lo estava disposto a provocar Miguel, trocou seu habitual deboche por preocupação:

— Rapaz, você está cada vez mais pálido! Está tudo bem com você? Se estiver doente pode tirar um dia de folga, ou uma semana...

Obviamente Miguel recusou, preferia ficar no trabalho e ocupar seus pensamentos, ficar em casa poderia resultar em uma maior aflição em sua mente. Estava decidido, enquanto tivesse certeza que não colocaria a vida de ninguém em apuros permaneceria com seu trabalho, permaneceria na escola e viveria seu dia-a-dia da mesma forma.

Apenas um problema não parava de consumi-lo ao ponto de não poder ser ignorado: sua relação com as mulheres de sua vida.

Sua irmã, Sofia, estava cada vez mais distante desde o incidente no cemitério. Quando questionada por Aghi, a pedido de Miguel, se ela lembrava de alguma coisa daquela noite, tudo que ela escreveu em seu bloco de papel foi:

"EU FIQUEI ACORDADA ATÉ TARDE, LEVANTEI PARA FECHAR A JANELA QUANDO CHOVEU E NÃO ME LEMBRO DE MAIS NADA."

A irmã não era de mentir, contudo, ambos estavam se evitando, ou seu mau humor recente a assustara, ou a garota estava escondendo o que ela lembrava daquela noite. De qualquer forma aquilo era incomodo demais, os dois sempre foram muito unidos, ficar longe de Sofia era como perder o carinho que ela tinha por ele.

Seu problema com Sofia era a distância que ele queria diminuir, entretanto, outro infortúnio, inverso, era constatado com sua namorada Isabel. Quanto mais eles se encontravam pior ficava seu relacionamento.

Eram tantos segredos, tantas mentiras que Miguel acabava por isolá-la sem perceber: demorava horas para responder uma mensagem da garota, criava desculpas para não ir em encontros e todo tipo de ação que visasse prolongar seus segredos.

Na última noite, sem conseguir elaborar alguma mentira acabou em um encontro desconfortável no shopping, enquanto estavam em uma mesa na praça de alimentação, Isabel  fez um desabafo tão sincero que o levou a querer abandonar todo aquele sigilo:

— Miguel, você sabe que eu nunca quis ser a chata da relação, juro. Entendo que você tem um jeito distante e que sofreu muito mais que eu na vida, afinal, você trabalha, estuda, cuida da Sofia e do vovô... E eu sou apenas uma garota mimada que mora com os pais...— Miguel tentou interromper, se existia alguém mimado no mundo com certeza não era Isabel, mas a garota prosseguiu sem deixá-lo fazer sua observação — mas, tem algo estranho, sei que você sabe também. Digo, a gente mal conversa, e quando nos encontramos você parece desconfortável e inquieto, como se quisesse que acabasse logo. Eu fiz alguma coisa errada? Algo tem te irritado, não sei... talvez algum problema com sua famíliaou comigo. Seja o que for, por favor me fala, quero ser sua companheira, quero cuidar de você!

Quero cuidar de você, era uma frase muito importante para Miguel. Desde que a mãe morreu ele é quem cuidava de todos, até mesmo de Aghi que entrou em sua vida da forma mais repentina possível. O que mais o machucava nessa frase era a verdade nas palavras, Isabel queria realmente ajudar, mas como poderia? Ela poderia renovar sua corrente espiritual? Poderia caçar Carniçais? Achar o tal Guardião Santo de Aghi?

Ela não poderia ajudá-lo, poderia entendê-lo, contudo não poderia fazer nada sem colocar a própria vida em risco.

— Relaxa, Bel. Só estou cansado do trabalho, escola, cuidar do vovô, Aghi e Sofia. Você sabe como eles são teimosos.— Mentiu com um sorriso falso, foi o melhor que podia entregar.

Não falaram muito mais naquela noite, deixou Isabel em casa e foi para seu conjunto, pelo menos estava com sua moto de volta. Conduzi-la pelo asfalto, acelerar e sentir o vento, aquilo era reconfortante e amenizava a dor em seu peito.

Em casa, agradeceu a Aghi por cuidar de Sofia e foi para o quarto dormir, uma tarefa que não foi cumprida. Adormecer parecia impossível, o que fez foi ficar deitado na cama de olhos abertos pensando em tudo enquanto tentava pensar em nada.

Em determinado momento da madrugada Aghi entrou em seu quarto e perguntou se ele tinha o chamado, Miguel respondeu que não e o amigo prontamente saiu sem dizer nada além de boa noite, era estranho, mas o garoto não era necessariamente normal. Em algum momento da noite escutou Aghi conversando sozinho, outro fator que era dentro da normalidade anormal do amigo.

Ao amanhecer, resolveu levantar e fazer um café, apesar da noite sem dormir o rapaz ainda estava bem e disposto. Abriu a porta do quarto e passou por Aghi na sala, o garoto dormia como se estivesse desmaiado, isso fez Miguel soltar um sorriso divertido.

Pegou uma caneca no armário e prontamente colocou a água para ferver, isso lhe deu uma ideia de perguntar para Sofia se ela gostaria de receber o café da manhã na cama — seria uma boa forma de quebrar o estranho clima que rondava sua relação com a irmã.

Suavemente abriu a porta do quarto da garota.

— Sofia, estou pensando em fazer alguma coisa diferente no café...— Parou assustadíssimo na entrada do quarto.

Seus olhos ficaram atônitos, seu semblante de felicidade caiu em seriedade ao deparar com a cena que presenciara.


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Capitulo 50!!!!!

Caramba, nunca pensei que iria tão longe...

Obrigado por acompanhar!

Um enorme abraço e bons livros!!

Ômega - O Guardião Santo (Fantasia/Suspense/Sobrenatural)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora