39. Carmesim Parte III

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No alto daquele monte estava tudo que ela precisava, munição, arma e o ângulo  extraordinário para acertar seu alvo e acabar de vez com aquilo tudo. Ela só precisava esperar, o que não a incomodou, o silêncio a distraia.

Enquanto esperava o momento derradeiro para consumar sua vingança, a mulher contemplava à vista das diversas edificações, passou tantos dias estudando a região, que já conhecia a rotina do bairro: os horários em que as pessoas saiam para trabalhar, que retornavam ou mesmo alguns moradores do único edifício residencial localizado próximo.

Não poderia deixar de notar, como tantas vezes o fez, em um homem asiático que morava no vigésimo andar daquele edifício. Em nada se relacionava com sua vingança, entretanto, algo era estranhamente atrativo nele.

— Boa noite, senhor Sakamoto, chegamos cedo do trabalho essa noite. — Ela disse para si mesma, enquanto aproveitava a demora de seu alvo,  um homem que em nada se parecia com ele.

O homem asiático, apelidado sarcasticamente por ela de senhor Sakamoto, aparentava ter na casa dos trinta e seis anos, morava sozinho naquele apartamento luxuoso, e durante aquela semana, em que ela estudava o local, nunca recebeu nenhuma visita, mulher ou homem.

— É racismo te chamar de senhor Sakamoto? Sei lá, se for me perdoa, apesar de achar que seu povo não sofreu tanto quanto o meu quando o assunto é racismo. O pior de nascer em uma família rica é que as pessoas ao redor tentam esconder o racismo por causa do dinheiro dos seus pais.

O homem trocava de roupa, tirava os sapatos e aquele sufocante terno de senhor de negócios.

— Sabe, Saka, posso te chamar de Saka, né? Então, vou sentir falta desses nossos momentos: você trocando de roupa e preparando para ir à academia e eu, aqui, com meu rifle de longo alcance esperando o homem que desgraçou minha família. Hoje provavelmente é nossa última noite, espero que você seja cavalheiro e me diga adeus, não? Certeza?

O homem calçava seu tênis, sem saber que estava sendo observado. Pegou um saco de ração e colocou na vasilha do gato, ele chamou o animal que prontamente apareceu para alimentar-se.

— Parece que o Doraemon tá com fome. Tem problema chamar seu gato de Doraemon? Não, claro que não.

O homem pegou o celular e começou a conversar com alguém, parecia feliz. Ele sorria e dava risada de uma forma bem espontânea, seja quem for o deixava feliz.

— É, Saka. Com quem você tá falando? Sua mãe? Uma namorada? Tudo bem, não sou ciumenta. Gostaria de ter uma vida comum também, acho que poderia ser até a senhora Sakamoto, imagina? Trabalharíamos o dia inteiro, e a noite nos divertiríamos juntos fazendo o jantar, assistindo uma série ou um filme, ouvindo sobre como foi nossos respectivos dias. Acho que seria divertido.

A mulher suspirou fundou, sentiu o frio daquela noite agradável, pensou nos rumos que a levaram até aquele exato momento, em tudo que sofreu.

— Nunca aconteceria. A vida é uma merda. Um dia você é uma criança no melhor lar do mundo e em outro você é uma mulher de trinta e cinco, cheia de rancor e ódio porque tudo que é bom foi arrancado da sua vida, por um erro que você não era nem viva para presenciar.

Enquanto sentia o remorso corroer sua alma, escutou aquela voz ressoar em sua cabeça:"ele está chegando, Majora." Aquele era o sinal da criatura que a acompanhou durante toda sua jornada. O último alvo estava chegando, Emiliano Espada, um dos homens mais ricos e influentes do país.

— Desculpa, Saka. O trabalho me chama. Foi um prazer ter um relacionamento platônico com você. Adeus.

O alvo era simples, uma assembleia sobre comunicação e dinamismo da mídia, no Gray Hoton, um enorme salão de conferências. Emiliano sairia de seu carro em breve, entre o estacionamento e o hall de entrada existia uma distância de quinze metros, levando-se em conta a idade do homem, ela teria tempo de sobra para mirar e matá-lo.

O dedo no gatilho, o suor escorrendo por sua testa e sua respiração indicavam que tudo acabaria naquele momento, tantos anos elaborando sua vingança e aquele era seu último momento: O homem mais importante em sua vingança, o desgraçado que destruiu sua vida.

"Fique atenta, Emiliano vai sair do carro acompanhado, você só terá uma chance." A voz tinha razão, um motorista e uma mulher bem jovem o acompanhavam, mas ele desceu do carro sozinho, sem a ajuda deles. Era um alvo inacreditavelmente fácil.

A mira estava alinhada, seria um único tiro. Estava pronta para acertá-lo quando a voz ressoou novamente em sua mente: "cuidado, tem alguém aqui", antes que ela pudesse fazer qualquer coisa uma pedra acertou com força o rifle, derrubando-o.

Ela voltou-se imediatamente para direita, o que viu a surpreendeu de uma forma inacreditável: Dois garotos, um pequeno e outro mais alto, que provavelmente era o responsável por acertá-la.

— Caramba, Aghi! É uma mulher mesmo. — O garoto alto a olhou bem nos olhos. — E ela é linda, cara.

Aquilo não podia ser realidade, duas crianças, duas malditas crianças. Estava tão perto, tanto tempo elaborando sua vingança e tudo prestes a ser arruinado. Maldição, maldição, maldição! Ela repetia em sua mente.

— Você tem namorada, Miguel! — Disse a criança menor.

— Eu não tô pedindo ela em casamento, só disse que ela é bonita.

Ela só teria alguns segundos antes que Emiliano entrasse no local do evento, precisava ser rápida. Precisa tomar alguma atitude, e enquanto pensava no que fazer a voz disse em sua cabeça "Você precisa matá-los, agora. Eles são um problema."

Ela rapidamente sacou a pistola do coldre da perna e apontou na direção do garoto mais velho.

— Vocês cometeram um erro.


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Aquele abraço!!!

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