Capítulo XLVIII - A forma mais antiga de comunicação

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Tangêr era um lugar fascinante. A cidade internacional, ex-protetorado espanhol, era um retrato perfeito da invasão da cultura europeia no mundo árabe. Benício e Vitória estavam no banco traseiro de um carro, atravessando a cidade para chegarem à casa onde passariam os próximos quinze dias. O importante Dr. Giancarlo Bergamaschi, pesquisador e magnata italiano, era grande amigo do falecido Dr. Constantin de Castro e foi professor da própria Dra. Vitória quando ela ainda ainda concluia os estudos pré-universitários. Tendo um carinho quase paternal pela filha do amigo, assim que soubera de seu casamento, ofereceu a ela sua propriedade na capital marroquina para que passasse sua lua-de-mel, já que ele não poderia comparecer à cerimônia.

- Signorina Vitto! - Disse, de longe, um homem alto e de bigode engomado, indo ao encontro de Benício e Vitória, que adentravam os portões do gigantesco Palácio Della Rosso.

- Ciao, Ettore! - Exclamou Vitória, abrindo os braços e indo ao encontro do homem.

- Perdonami, intendevo, Signora Vitória. - Corrigiu-se ele, em tom de brincadeira.

- Ni signora, ni signorina, Ettore. Dottoressa. - Disse Vitória, rindo, enquanto o abraçava. - Come stai?

- Molto bene, cara mia. - virou-se para Benício. - Creio que sejas o Senhor de Benício de Souza, si?

- Sim, senhor. - Respondeu Benício, apertando a mão do homem. - Temo não falar italiano.

- Não te preocupes, caro mio, eu falo todas as línguas do amor. - riu - Prazer, Ettore Zanini, a teu dispor. - Introduziu-se Ettore, com seu pesado sotaque.

Os três adentraram o riad e foram cercados completamente pela opulenta e detalhista arquitetura hispano-mourista. O hall de entrada era cortado por um magnífico espelho d'água e possuia um teto altíssimo e abobadado. As paredes repletas de estuques possuiam um tom claro que constrastavam com alguns zellij em cores mais escuras. Ao passo que cortaram o hall, chegaram ao pátio central - uma gigantesca área aberta cuja casa erguia-se em volta. Limoeiros e laranjeiras decoravam o pátio e cercavam um outro espelho d'água de azulejos em mosaico.

- Aqui está o pátio. - Disse Ettore. - Não sei se estão familiarizados com a arquitetura marroquina, mas todos os cômodos da casa dão para este lugar.

- É incrível. - Comentou Vitória, deslumbrada pelo local.

- Sala de estar. Sala de jantar. Piscina interna. Sala de leitura. Quartos. E o quarto do casal, a entrada é por ali, mas a cama fica no andar superior. - Informou Ettore, apontando cada local ao ponto que falava. - Ainda há um terraço. Podem acessá-lo do quarto.

- Fascinante. - Disse Benício, estupefato.

Ettore Zanini era mordomo do Dr. Giancarlo há muitos anos. O patrão residia em Tetuão, cidade vizinha de Tangêr, mas encontrava-se na Itália visitando a família. Encarregado de acompanhar a chegada da Dra. Vitória e seu marido, Ettore explicou sobre o funcionamento da casa, os empregados, os costumes locais e mais coisas sobre a cidade. Lamentou precisar retornar a Tetuão no dia seguinte, mas informou que sua filha, Nicola, antiga amiga de Vitória, estava na cidade e prometeu visitá-los antes que embarcassem de volta para o Brasil.

Benício e Vitória terminaram de conhecer a casa, receberam suas malas e foram jantar. A cozinheira era Dona Carlota, uma espanhola de meia idade e um pouco mal encarada. A outra era Jamila, que fazia de tudo um pouco, uma mocinha mulçumana de vinte e poucos anos com um jeito doce e que falava muito baixo. Após comerem o delicioso tajine de cordeiro e passarem algumas horas na sala conversando, os dois foram recolher-se. A noite estava maravilhosamente agradável, com uma leve brisa fresca que invadia todos os cantos do riad.

Castro e SouzaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora