Capítulo LVI - Estrondos

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Vitória andava pela casa de Helena. Uma festa acontecia, mas Vitória não escutava nenhuma música. Um estrondo familiar soou ao longe e uma grande confusão se formou - jogaram-se todos no chão. Vitória estava confusa. Do outro lado do salão estava Rosalinda, bela como sempre, em seus trajes militares discutindo com uma mulher em vestimentas similares. Vitória aproximou-se.

- Please, take Lady Rosalinda and Miss Castro out of here!

- We're not going anywere! And it's Nurse Seymour and Nurse Castro here, Mrs. Ramsay. We volunteered alongside all these girls and we shouldn't be a priority.

- Girls, we need to evacuate!

- We will be evacuated with the other nurses, doctors and pacients. Right, Vitto?

- Take them out of here, officers. And, please, keep them safe.

Outro estrondo. Mais outro. Vitória teve seu braço agarrado por alguém.

- Blake? - Balbuciou.

- Victoria, my love, let's get out of here!

- No, wait! Rose!

- Vitória!

Outros estrondos. Blake arremessou Vitória no chão e jogou o corpo em cima dela. A casa de Helena parecia desmoronar. Um estrondo, dessa vez parecendo mais alto que os outros, despertou Vitória de súbito, que acordou na cama vazia, coberta de suor.

- Bom dia, Vitto. - Disse Helena. A prima, a cunhada, Lili e algumas outras mulheres estavam sentadas à mesa tomando café da manhã.

- Bom dia. - Disse Vitória, enquanto dirigia-se ao bufê para pegar uma xícara de café.

- Está tudo bem, Vitto? - Perguntou Marieta. - Pareces cansada.

- Eu estou bem. Dormi mal, apenas.

- Mal? Nós ouvimos o qual mal dormiste noite passada. - Ironizou Helena.

- Como assim?

- Tua noite pareceu deveras ardente pelos barulhos que escutamos de madrugada...

- Mas não fizemos nada. - Esclareceu Vitória.

- Como?

- Seja lá que barulho escutaram, não éramos nós. - riu - Dormimos a noite inteira, Benício estava bêbado demais.

- Então... De quem eram os gemidos?

- Por falar nisso, onde está todo mundo? Nem notei que Benício não estava...

Vitória escutou um estrondo. A xícara de café que segurava foi ao chão. Levou ambas as mãos aos ouvidos e abaixou-se, quase se jogando no chão. Tudo pareceu ficar no mais agoniante silêncio. "... foram caçar", foi a única frase que Vitória conseguiu escutar dentre as outras coisas que Helena dizia.

- Vitto? Vitto! - Chamou Marieta. Vitória já escutava normalmente. - Está tudo bem?

- Está. - Assentiu Vitória. - Está sim. Desculpe-me pela xícara, Lena. Eu irei deitar-me mais um pouco, com licença.

Passava um pouco das onze quando Benício, Sebastián, Alonso e os outros homens retornavam com as espingardas nas costas e carregando alguns patos-do-mato mortos pendurados por ganchos.

- Que ideia foi essa de irem caçar assim? - Repreendeu Helena ao vê-los entrarem.

- Calma, meu amor. - Disse Sebastián.

- Perderam o café. E estão imundos! Nem pensem em entrar com essas armas e esses bichos mortos, deixem tudo lá fora!

- Era realmente necessário saírem assim? - Questionou Marieta.

- Nem demoramos. Voltamos a tempo para o almoço. - Justificou Sebastián.

Um dos empregados de Helena começou a recolher as armas e os patos enquanto os homens iam para a mesa do café comer o que havia restado.

- Onde está Vitória? - Perguntou Benício ao notar sua ausência.

- Está no quarto. E já lhe adianto que ela deve estar furiosa! - Disse Helena.

Benício tirou a jaqueta de caça e subiu as escadas. Ao entrar no quarto deparou-se com Vitória sentada no divã, sem os sapatos, com os joelhos para cima e um copo de uísque em mãos.

- Bom dia. - Disse Benício. Vitória não respondeu. - Está tudo bem?

- Está. - Disse Vitória, fria, sem ao menos olhar para Benício.

- Ah, não fique chateada. - Pediu Benício, indo até ela. - Só perdemos o café.

- É. - levantou-se.

- Não está realmente chateada, não é?

- Não estou chateada. Eu não tenho o direito de estar chateada.

- Eu apenas fui caçar, Vitória. Desde quando faz tanta questão da minha companhia para o café?

- Nenhuma, Benício. Não faço questão alguma.

- Estavas chorando? - Perguntou Benício ao notar que Vitória tinha os olhos inchados.

- Por acaso importa-se?

- É claro que me importo, mas me parece surreal que tu, dentre todas as pessoas do universo, teria chorado porque perdi o café. O que está havendo, Vitória? Eu cheguei a pensar em te chamar para ir conosco e...

- Ir convosco? Claro, porque, dentre todas as pessoas do universo, eu devo adorar pegar em uma arma e atirar em animais!

- Eu não sei, eu pensei que... Ah, não.

Benício suspirou e cerrou os olhos. Percebeu, enfim, o que estava havendo. Sentiu a culpa imediatamente apoderar-se dele.

- Vitória, eu sinto muito. O barulho... Eu não...

- Eu pedi. Eu pedi para que não fossem caçar.

- Perdoe-me, por favor, eu não pensei...

- Não pensaste? Não pensaste que uma enfermeira de guerra teria problemas com barulhos de tiro?

- Por favor, perdoe-me. Eu realmente não havia pensado...

- Eu ainda tenho a bala que tiraram da minha perna guardada no meu porta-joias e tu sabes disso porque eu lhe mostrei! - Gritou ela, um pouco alterada. - Sabes de tudo isso.

- Sim, sim, eu sei. - suspirou - Por favor, perdoe-me. Eu não deveria ter ido, quer dizer, eles teriam ido sem mim, provavelmente. Não sei se faria muita diferença e...

- Pelo menos eu não teria acordado sozinha na cama suando frio e passado as últimas horas tremendo, afinal hoje é um dia especial para a minha prima e eu não estragaria com as minhas...

- Sim, tens razão! Eu não deveria ter ido, apenas...

- Deus, eu me sinto ridícula. - murmurou.

- Vitória...

- Está tudo bem, Benício. - Concluiu Vitória, soando triste. - Não brigarei contigo. Não quero brigar. Vamos apenas retomar a nossa agenda. Eu não deveria ter pensado que...

- Pensado o quê?

- Não importa. Apenas finja que não tivemos esta conversa e vamos descer.

- Mas...

Vitória calçou os sapatos, lavou o rosto e maquiou-se para melhorar um pouco sua aparência. Benício tentava pedir desculpas e falar com ela, mas ela copiosamente repetia que estava tudo bem. No fim da tarde, quando retornaram para o Rio, Vitória não parecia estar mais chateada, mas também não direcionava a Benício uma frase se não fosse por extrema necessidade. E ele, sem saber exatamente o que fazer, deixava que ela confortavelmente ignorasse-o até que ele mesmo passasse a ignorá-la. E não brigaram mais.

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Castro e SouzaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora