Gelada e ensolarada, a Cidade Imperial dava amostras do clima europeu para as pessoas que nela residiam ou visitavam. O casarão colonial de Helena e Sebastian, com aquele enorme jardim, era palco de um pique-nique animado entre a família Castro e alguns amigos. As mulheres usavam meias levemente mais grossas e mangas mais compridas e os homens tinham o conforto de colocarem um suéter entre a camisa e o paletó. Apesar de tudo, o frio não estava insuportável, já que o sol fazia-se presente. As crianças corriam, caíam e brincavam pela grama, enlouquecendo suas babás, enquanto os adultos permaneciam sentados em suas cadeiras ou tomavam sol em toalhas estendidas pelo gramado.
- Lena, como consegues? - Perguntou Lili para Helena. As duas estavam sentadas em uma enorme toalha de pique-nique com Marieta e Vitória, observando as crianças correrem.
- Consigo o quê?
- Viajar para outro país, voltar com uma barriga enorme e casualmente ser anfitriã para toda a tua família em um fim de semana logo depois de retornar. Nunca ficas cansada? - riu.
- Eu duvido que Helena seja humana, às vezes. - Disse Vitória, virando uma taça de champanhe.
- Quando eu estava grávida do Joaquim, eu fiquei na residência de inverno dos meus pais no Sul até ele nascer. A ideia de lidar com a vida real me enlouquecia! - Desabafou Lili.
- Não é exatamente tão difícil. - Disse Helena. - Lidar com a minha família é simples comparado a ter que lidar com a família González nos últimos meses.
- Tua sogra ainda te odeia? - Perguntou Marieta.
- Odeia. E eu a odeio ainda mais.
- Que relação mais amorosa e saudável. - Comentou Vitória, sarcástica. - Pergunto-me se eu me daria bem com a minha sogra.
- Absolutamente não. - Respondeu Marieta imediatamente.
- Interessante... - Murmurou Vitória.
- Eu me dava bem com a minha sogra. - Disse Marieta. - Mas desde que Lourenço morreu não tenho muito contato com a família dele. O que é uma pena, queria que as crianças tivessem mais contato com os tios e avós.
- Eles parecem bem para mim. - Comentou Lili, rindo, ao ver João, Bernardo, Antônio e Leonardo correndo pelo jardim.
Lili pôs o queixo no ombro de Marieta e abraçou carinhosamente. Ela sentiu Marieta encolher-se e desvencilhar-se de seu abraço, olhando preocupadamente para os lados.
- Ninguém está olhando. - Sussurrou Lili.
Helena e Vitória notaram imediatamente a preocupação que Marieta tinha. Vitória terminou de virar sua bebida e deitou no colo de Helena.
- Pronto, agora ninguém irá perceber. - Disse Vitória. Helena riu e abraçou a prima.
- Viram? Ninguém olhando! - Disse Helena.
Marieta riu e reclinou-se para trás até cair no abraço de Lili novamente. Tinha medo, mas valia a pena a inquietação.
A tarde prosseguiu agradável. Era parte da etiqueta da família não mencionar o acidente de Benício ou o estado conturbado de seu casamento com Vitória, mas era quase irresistível não perguntar sobre o que havia se passado nos últimos meses. Eles pareciam bem, tão bem quanto na noite de Natal onde, aparentemente, houve a briga que consumou o estado de crise matrimonial entre os dois. Mas pareciam tão bem quanto um casal normal - próximos o suficiente, apáticos na medida certa. Helena, que conhecia a trama um pouco melhor, observava curiosa a maneira como se comportavam. Os dois estavam de pé em frente à mesa que foi posta para o lanche bebendo e conversando casualmente, sem muito entusiasmo. O dia inteiro ela notou uma estranheza no comportamento da prima, mas era incapaz de apontar o dedo e reconhecer o que era. Ela viu Vitória colocar sua taça na mesa e pedir licença, correndo para dentro da casa imediatamente.
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Castro e Souza
Historical FictionVENCEDOR #Wattys2018 Em 1925, dois membros da alta burguesia carioca - os belos herdeiros Vitória de Castro e Benício de Souza - tornam-se cúmplices de um crime quase perfeito, mas acabam colocando suas próprias reputações em jogo para ocultar seus...