Capítulo LXXVI - Continue

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Benício acordou de súbito. Seu sono, leve por natureza, foi interrompido ao perceber que Vitória mexia-se na cama. Ele não lembrava de ter dormido. Vitória tremia e suava a ponto de sua camisa estar molhada. Benício sacudiu-a para que acordasse do que parecia ser um pesadelo. Ela levantou assustada.

- Está tudo bem. - Disse Benício.

- Que horas são? - Perguntou Vitória, ofegante.

- Quase quatro. - Respondeu Benício, olhando o relógio na mesa de cabeceira.

- Eu preciso ir. - Disse Vitória, nervosa, cambaleando para fora da cama. - Logo vai amanhecer.

- E daí? Não é como se isso fosse um problema mais.

- Olhe como eu estou vestida!

- Sim, estás de terno, coberta de suor e com uma nuvem de odor de cachaça em volta. Fique aqui.

- Desculpe. - Disse Vitória indo em direção à janela,

- Vitória, não. - Disse Benício colocando-se na frente dela. - Tome um banho e vá dormir.

- Mas eu...

- Ligarei para a tua casa e pedirei que Sofia traga um vestido de manhã cedo, mas, por favor, não saia assim.

- Descul...

- Pare de se desculpar, pelo amor De Deus.

Vitória foi para o banheiro e Benício sentou na cama, mentalmente esgotado, ponderando sobre o que fazer naquela situação. Não, aquilo estava longe de ser normal ou esperado. É claro que, em algum momento, ele a imaginou bêbada, arrependida e voltando para ele. Mas aquilo não era sintoma de paixão ou saudades, aquilo era um tipo de desespero que nunca imaginou que, dentre todas as pessoas do mundo, Vitória pudesse sentir - e que ele sabia que pouco teria a ver com ele. Era agoniante imaginar o que era capaz de levar uma mulher como ela àquele estado de exasperação.

- Obrigada pela camisa. - Disse Vitória ao sair do banheiro, abotoando uma das camisas de dormir de Benício.

- Não roube esta como fizeste com as outras. - Respondeu Benício, divertido, pegando um copo de água na escrivaninha e entregando para Vitória. Ela deu algo que parecia ser um leve sorriso ao pegar o copo. - De nada.

- Mais uma vez, perdoe-me por vir aqui assim...

- Não há nada para se desculpar.

- É claro que há.

- Bem, creio que há um tempo eu desenvolvi um certo gosto por agradecimentos no lugar de desculpas.

- Obrigada, então, mais uma vez.

- Como estás?

- Esta não é uma pergunta com uma resposta curta ou objetiva.

- Estou ouvindo.

- Benício, é sério, não é...

- Se não queres falar, tudo bem, não fale. Mas que não seja por receio do meu julgamento ou...

- Eu receio que não seja justo contigo... Despejar meus problemas em ti. Assim como não foi justo eu ter vindo aqui. Especialmente depois de tudo o que aconteceu.

- Cabe a mim decidir se é justo ou não. E eu sinto que precisas conversar. Por favor... Há realmente algo possível de me chocar a essas alturas?

Vitória sentou na cama abraçando o próprio corpo, friccionando o material macio da camisa de algodão na pele, e respirou fundo. Benício sentou-se ao lado dela, olhando para frente e um pouco afastando, como se seu olhar e seu corpo dessem espaço para que somente seus ouvidos se fizessem presentes.

Castro e SouzaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora