Capítulo LIII - Armário

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O Palácio de Laranjeiras recebeu a nata da sociedade carioca para o aniversário do Governador do Distrito Federal. Os fotógrafos ficavam amontoados nos portões da propriedade para registrar a chegada de políticos, empresários, herdeiros e suas famílias de vários lugares do Brasil que chegavam aos montes na Rua Paulo César de Andrade em carros importados com motoristas de quepe e luvas brancas. Um Chrysler 1925 B70 Phaeton azul-claro estacionou e imediatamente os fotógrafos correram até ele. Quem o dirigia não era um motorista e sim seu próprio dono; ao lado dele, uma conhecida socialite carioca descia, coberta de joias, ajudada pelo manobrista.

- Benício, é um prazer revê-lo! - Disse Dona Aracy, esposa do Governador, estendendo a mão para um beijo.

- É um prazer revê-la também, Dona Aracy. - Disse Benício, beijando a mão da mulher.

- Meus pêsames pela perda do teu cunhado, meu caro. Sei que Emílio lhe escrevera uma carta, mas, infelizmente, não pude ter contigo pessoalmente.

- É, claro. - pigarreou - Obrigado.

- E meus parabéns pelo teu casamento. - Disse Dona Aracy, virando-se para Vitória. - Não vai me apresentar tua esposa? - sorriu.

- Sim, claro. Dona Aracy, essa é a Doutora Vitória de Castro. Vitória, esta é Dona Aracy Meirelles, esposa do Governador Emílio.

- É um prazer conhecê-la. - Disse Vitória, sorrindo e estendendo a mão para um aperto.

- Igualmente, minha cara. - Respondeu Dona Aracy, apertando a mão de Vitória. - Lamento não termos comparecido ao casamento, soubemos que a festa foi esplendorosa.

- E foi mesmo. - Confirmou Vitória, com um sorriso ameno. - Obrigada.

- Com licença, eu irei cumprimentar Artur e Emanuel. - Avisou Benício, apontando para os filhos mais velhos de Dona Aracy que estavam do outro lado do salão.

Benício afastou-se e Vitória foi deixada a sós com Dona Aracy. Tinha seus quase cinquenta e poucos anos, vestia-se de forma muito elegante e tinha aquele olhar blasé, distante e misterioso, de quem está sempre sob efeito de uma taça e meia de vinho.

- Então, a senhora é Doutora? - Disse Dona Aracy.

- Sim, eu sou. Não sou médica. - riu - Sou cientista.

- Estou ciente. - riu - Ouvi falar muito de ti, querida. - Comentou Dona Aracy. Vitória não sabia decifrar se o tom dela continha malícia ou desgosto. Talvez os dois.

- Mesmo?

- É claro. - sorriu - Uma moça da tua distinção não passa despercebida. Soube que é muito simpatizante da causa feminista.

- Bem, eu sou uma mulher com um doutorado. - riu.

- Claro, claro. Eu também sou muito defensora do progresso feminino. Veja, todas as minhas filhas poderão ir para a universidade antes de casar se assim desejarem. As mais novas irão para o Colégio Imperial ano que vem.

- Nossa. - sorriu - Minha prima também. Isso é incrível, Dona Aracy. Fico muito feliz de saber disso.

- Por que não vens para o chá qualquer dia? Poderás conhecer minhas meninas. Quem sabe até aconselhá-las um pouco.

- Seria uma honra - sorriu - De verdade.

- Ótimo. Conversaremos mais depois, querida. Com licença.

Uma cantora lírica apresentava-se no salão principal enquanto a festa acontecia após o jantar. Era uma reunião um pouco monótona; valsas europeias eram tocadas uma após a outra, mas ninguém dançava. As pessoas apenas conversavam e bebiam champanhe como se fosse um esporte. Benício estava reunido com alguns conhecidos na sala.

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