Dois - Biblioteca e Outros Problemas

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-Você está atrasada! Por que está com a maquiagem pela metade? – Imogen piou quando me aproximei da entrada do refeitório.

-Longa história. – suspirei.

Havia passado os últimos dez minutos no banheiro tentando lidar com o estrago em meus olhos, mas a porcaria da maquiagem à prova d'água não permitiu que eu obtivesse sucesso em minha empreitada. Metade do meu rosto estava branco e preto, outra metade corada de maquiagem. E eu realmente não estava me importando com aquilo no momento. Especialmente porque meu cérebro ainda se encontrava em um estranho estado misto de encantamento, vergonha, constrangimento e INFIDELIDADE.

A palavra piscava em neon à frente dos meus olhos. Eu não havia feito nada, aquela insistência não fazia o menor sentido. E tudo o que meu consciente me rebateu foi que talvez estivesse rolando algum tipo de premonição... Como se eu fosse me engalfinhar com o bonitão pelos corredores de Harvard a qualquer momento... Como se meus hormônios fizessem qualquer sentido... Eles não faziam. Definitivamente. Ri sozinha de minha estúpida e tentadora conclusão e só acordei do devaneio quando notei a expressão confusa de Imogen me encarando.

-Terra chamando Maddy! – ela estalou os dedos na frente dos meus olhos. – Você parece completamente desconcertada. O que aconteceu naquela aula? Já está abalada pelo mundo jurídico? – ela tagarelou, como sempre fazia, sem deixar muito espaço para que eu respondesse.

-Nada... - dei de ombros - Os professores só são incrivelmente tediosos.

-Mas isso nós já esperávamos, não é mesmo? - ela rolou os olhos quando começamos a entrar no refeitório - Só que tem mais alguma coisa que você não quer me contar. - o sorriso esperto dela foi de orelha a orelha. O dedo indicador apontava sem pudor para a ponta do meu nariz.

Torci os lábios. O clichê da melhor amiga que te conhece em proporções ridículas e constrangedoras se encaixava muito bem quando se tratava de Imogen. Ela apareceu na minha vida no jardim de infância, um pedido educado de empréstimo de um lápis cor-de-rosa, porque o cachorro havia comido o dela, qualquer desculpa assim. E aparentemente não encontrou outra melhor amiga para importunar desde então. E não estive, esse tempo todo, em posição de reclamar a respeito, porque com o clichê também vinha o fato de que eu poderia contar com aquela loira platinada para qualquer coisa na vida, e por isso eu era eternamente grata.

Exceto quando ela tentava me arrancar coisas sobre as quais eu preferia não falar.

Como o colega de classe/deus grego/cara impertinente e metido.

E infidelidade (não, ainda não havia chegado a uma conclusão sobre).

Imogen certamente não concluiria pela infidelidade. Não era uma palavra no vocabulário dela. Amor livre e selvagem, era seu lema de vida. Sem contar a aversão a Trevor que existe desde o segundo em que eu contei para ela sobre o nosso namoro. Imogen torcia pela infidelidade. Eu não pediria a opinião dela a respeito disso.

Especialmente porque não senti necessidade nenhuma de dividir a existência de meu colega de classe lindo/gostoso/impertinente/metido/deusgrego com ela. Imogen seria uma distração para a atenção dele, que pareceu estranha e irritantemente estar voltada a mim, pelo menos durante o período de aula. Não, eu não queria dividir. Queria aqueles azuis focados em mim. Só em mim.

O pensamento me causou incômodo mais uma vez.

-Nada. Não gostei das minhas colegas de classe, muito loiras. - comentei.

-Você já se olhou no espelho hoje, Maddy? – ela revirou os olhos novamente, enquanto nos aproximávamos do balcão do restaurante.

Não significava ser hipócrita não gostar de pessoas muito loiras sendo uma pessoa muito loira. Eu não conseguia me enquadrar na categoria. Imogen também era muito loira, o que não provava meu ponto, logo, pode-se concluir que eu geralmente não faço sentido algum.

Desvio de CondutaWhere stories live. Discover now