Quarenta - Três Palavras e Outros Problemas

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Eu tinha comigo a constante sensação de estar despencando do centésimo andar de um arranha-céu. Era a melhor metáfora para descrever a ansiedade que não me deixava pensar, respirar, viver. O medo do novo costumava me trazer um gostoso frio na barriga, costumava disparar meu coração vez ou outra de forma prazeirosa. Daquele novo que me aguardava do outro lado do país, na ensolarada e glamourosa Los Angeles, o medo era muito mais profundo, nada de frio na barriga gostoso, de coração disparado prazerosamente. Não, nada disso. O medo apresentou-se sozinho, deixou um buraco em meu peito, em minha mente, tomou-me inteiramente para si, eu não era mais nada, só medo.

Eu não sabia o que esperar. Tinha medo da mansão, tinha medo da proximidade com Anthony Muñoz, tinha medo de que algo de ruim pudesse acontecer à minha mãe, Imogen, Matt e Mark, tinha medo de levar um tiro, tinha medo de que o FBI me traísse, tinha medo de que alguém em La Recocha me descobrisse, tinha medo de que Dylan fosse descoberto.

Estava prestes a surtar.

Rosario enviara-me a passagem para Los Angeles naquela noite mesmo, pronta para partir na tarde seguinte. Dormi na casa de Dylan e ele me levou cedinho ao dormitório para que pudesse fazer minhas malas e trancar minha matrícula em Harvard. Casey não estava, o que me poupou de explicar aonde diabos eu estava indo no início do ano letivo, sem nem mesmo receber as notas das primeiras provas. Doeu, doeu para caramba tirar minhas coisas de lá antes dos três anos de que necessitava para me tornar uma advogada. Não foi a maneira que imaginei saindo de Harvard, ainda que tivesse esperanças de que seria uma medida temporária, de que tudo daria certo e eu poderia voltar em um ano ou dois para concluir minha graduação. Não custava sonhar, embora a sensação de sair pela porta dos fundos fosse amarga em minha boca e em meu coração.

Resolvida a questão, o medo só cresceu. Porque eu percebi que não tinha para onde correr mais, não tinha mais Harvard, não tinha minha casa em Nova York, nem sequer tinha a casa de Imogen ou Dylan. Só me restava Anthony Muñoz e sua mansão mafiosa na Califórnia. Ou o FBI e seu plano mirabolante. Eu não achava que poderia confiar todas as minhas fichas em um plano comandado por Lisbeth femme fatale, então a opção ainda precisava ser considerada com os dois pés atrás.

Antes de me levar ao aeroporto, Dylan me levou ao pequeno escritório do FBI montado em Cambridge como base para a Operação Armagedom. O capitão Rutherford precisava me passar as últimas instruções e fornecer os aparelhos eletrônicos seguros para manter contato com eles e, especialmente, com Dylan, que seria meu porto seguro no caos mafioso.

Recebi um notebook, mediante o qual deveria enviar os emails secretos diários ao FBI relatando todos os aspectos do meu dia que julgasse importantes. Na dúvida, deveria enviar um diário, sem deixar passar qualquer detalhe, porque eles eram cruciais na condução da operação, e eu não tinha conhecimento suficiente de causa para dizer o que seria útil ou não, segundo uma arrogante Lisbeth femme fatale.

Ela claramente não estava feliz com a ida de Dylan para Los Angeles, e eu tinha duas teorias sobre a razão: 1) ciúmes de Dylan perto de mim e longe dela; 2) inveja, porque ela gostaria de ser o centro da operação no olho do furacão. Em qualquer das duas hipóteses, eu me questionava como diabos ela conseguia ser uma agente do FBI encarregada de uma missão tão importante, se era deixada levar por emoções negativas daquela forma tão amadora.

Mais um motivo para manter dois pés atrás com o FBI.

Também ganhei um celular secreto, com uma linha secreta e protegida, pela qual poderia falar tranquilamente com Dylan, caso precisasse ou surgisse alguma emergência. Deveria guardá-lo como se minha vida dependesse dele, bem longe dos olhares do professor Vidal e, especialmente, de Anthony Muñoz. Fiquei me perguntando quanto tempo aguentaria antes de acionar aquela maravilhosa linha secreta, já que eu não poderia vê-lo com a frequência que meu coração achava adequada para se manter batendo.

Desvio de CondutaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora