Assassin's Creed - Origins (18/02/2018)

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Com a história toda terminada, missões secundárias também, e todos os locais concluídos - só restando comprar algumas habilidades, conseguir troféus e terminar as arenas - chegou a hora de impressões mais detalhadas sobre essa joia.

Evitarei ao máximo possível spoilers de enredo. Deixarei comentários sobre eles ao final, sinalizando antes.

Sobre jogabilidade e experiência:

- Este se tornou meu Assassin's Creed favorito, empatando com o anterior, o II, no quesito enredo, mas superando-o em ambientação e possibilidades. É um jogo bem polido, devoto ao passado da franquia e respeitoso aos fãs, mas que ao mesmo tempo abre um novo caminho e uma infinitude de coisas a serem exploradas.

- A jogabilidade é bem menos stealth (foco dos games anteriores) e mais action-RPG. Mesmo atacando de longe com o arco ou dardos, inevitavelmente o jogo nos insere numa luta corpo-a-corpo. Há nisso prós e contras:
--- De início estranhei, principalmente por não ser meu estilo de jogo, mas a opção se situou muito bem no mundo proposto e funciona. O combate está bem melhor que nos outros jogos, empolga e requer prática e estratégia para ser bem dominado, ao contrário da mera alternância de botões para encadear combos que se via nos outros títulos da série. Há foco no aprimoramento das armas e defesas de Bayek, o protagonista, e realizar quests por elas torna-se não só diversão, mas necessidade.
--- Por mais que o sistema de luta esteja muito bem feito, um contra é a curva de XP, muito absurda em comparação a determinados inimigos e locais encontrados, o que limita muito a exploração do rico mapa que o jogo tem (eu, por exemplo, quis explorar as Pirâmides de Gizé logo no começo, pela mística do local, e tive minha escolha prejudicada pelos inimigos bem acima de meu nível, sinalizados com uma caveira, que me derrubavam com 2-3 hits). Isso não seria um problema em si se o game oferecesse alternativas estratégicas - focadas, aliás, no stealth - para me infiltrar e cumprir esses locais, mas nem a Hidden Blade derruba com 1 só hit os inimigos pegos de surpresa, tornando a única alternativa para se resguardar de inimigos mais fortes "farmar" XP pelo mapa cumprindo as sidequests entre as missões principais. Logo dominei a técnica e já estava beirando o nível 40 (máximo) a 2/3 da história principal terminar, mas considero que isso poderia ter sido melhor trabalhado.
--- Ainda no pouco enfoque ao Stealth, as criativas missões de assassinato de AC Unity e, principalmente, AC Syndicate, com exploração de fraquezas do local e uso de recursos/pessoas para facilitar a missão, gerando de duas a três maneiras diferentes e criativas de cumprir o objetivo - sem contar o simples "cair na porrada" - desapareceram. Apesar de ainda possuírem locações interessantes, as missões de assassinato caíram ao cúmulo da simplicidade e acabam fáceis demais (permitindo um simples assassinato aéreo, por exemplo), ou descambam para o "cair na porrada" pela falta de opções. Triste, pois os alvos deste jogo são muito melhor trabalhados e complexos que os dos dois games anteriores.
--- Uma inovação no Stealth, para não dizer haver nenhuma, é a introdução de um momento em câmera lenta quando Bayek é descoberto por um inimigo, com um sinal de alarme e a ideia de se poder reagir rapidamente no intervalo para evitar o alerta na base - algo por sinal descaradamente copiado do MGSV: Phantom Pain. Porém, achei de pouca serventia em comparação à sua inspiração, pois em AC Origins o desacelerar de alerta é muito reduzido e mal se pode fazer nada.

- Feitas as críticas, o restante da jogabilidade é uma delícia. Andar de cavalo ou camelo é ótimo, há vários veículos terrestres e aquáticos disponíveis, e o escalar está de uma fluidez excelente. Neste jogo é praticamente possível escalar QUALQUER COISA, desde um muro mais liso até a encosta de uma montanha, deixando a exploração mais livre e a tomada de decisões de caminhos mais aberta - ao contrário dos ACs anteriores, em que alguns locais era preciso passar algum tempo deduzindo, após pular sem sucesso diante de paredes inúteis, qual o caminho certo para se subir.

- A águia Senu é uma excelente inovação. Tendo a serventia de um drone moderno, é usada para vistoriar locais antes de Bayek invadi-los, mapeando não só objetivos, mas guardas, tesouros, piras de alarme e muito mais. No início apanhei um pouco para aprender tudo que ela podia fazer, o que aliás é ampliado quanto mais Viewpoints sincronizamos (serventia nova a esses lugares, além de pontos de viagem rápida). Da metade em diante, já conseguia praticamente mapear todo meu caminho antes de adentrar um local.

- O Egito do jogo está LINDO. Obviamente é uma versão reduzida, com aproximadamente 10km de distância de uma ponta a outra, e praticamente só se visita a margem oeste do Nilo no jogo padrão (há uma DLC no Sinai, e outra ao sul, em Tebas, mas provavelmente não as adquirirei). Porém, a escala é compensada pela fidelidade e esmero históricos. Gizé, Alexandria, Mênfis, Cirene estão todas lá com sua arquitetura e monumentos. Navegar no Nilo é épico, e os canais de irrigação e plantações mostram como o rio era importante àquela civilização. Não só na questão estrutural, mas em costumes, o game é rico e verossímil: vemos o culto nos templos, a mumificação, a agricultura, os benefícios e problemas trazidos pelo contato com os gregos após a conquista de Alexandre, e muito, muito mais. Até a exploração de tumbas perdidas, tão forçada pelo cinema hollywoodiano, é mais natural e crível. A própria fauna é riquíssima e até perigosa, crocodilos e hipopótamos sendo uma ameaça constante ao jogador. Em ambientação histórica, com certeza é o AC mais detalhado até o momento, embora faça falta a enciclopédia interna existente até o Syndicate, embora isso decerto seja corrigido com a DLC educacional que a Ubisoft já anunciou para logo.

DAQUI PARA BAIXO, HÁ SPOILERS DE ENREDO...
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- A história do jogo também é forte e envolvente, talvez um dos melhores enredos desde a Era Ezio. Como mais da metade dos games da franquia, o foco é uma trama de vingança. Bayek de Siuá é um dos últimos Medjai (há uma sonoridade divertida com "Jedi" aqui, e o game explora isso de forma proposital ou não em alguns momentos, até envolvendo o filme recente de SW) do Egito, uma espécie de polícia da época dos antigos faraós que entrou em franca decadência com a subida dos Ptolomaicos (a dinastia de origem grega entronada após Alexandre conquistar o Egito). Envolvendo-se numa conspiração que resulta na morte de seu filho, Bayek e a esposa Aya (personagem 100% mais interessante que o protagonista, e que merecia, senão ela no papel, mais destaque e missões do que tem) iniciam uma caçada ao grupo de vilões mascarados responsável, em meio à guerra civil entre o faraó Ptolomeu XIII e sua irmã Cleópatra, ao mesmo tempo em que os romanos interferem. Dentre reviravoltas e descobertas, os mascarados revelam-se a Ordem dos Anciãos, precursora dos Templários. Para combatê-la, Bayek e aliados estabelecem a Irmandade dos "Hidden Ones", que futuramente será chamada de "Assassinos".

- Apesar de ser mesmo uma história de origem, o enredo abre muitas possibilidades à franquia. Há como a história de Bayek e Aya ser explorada em jogos passados imediatamente depois do fim da trama (a trilogia Ezio já fez isso), e pela primeira vez desde ACIII há uma trama de tempo atual mais relevante, com a inventora Layla Hassan desafiando a Abstergo ao explorar as memórias da múmia de Bayek enquanto testa um novo tipo de Animus. William Miles (pai do Desmond) reaparece ao final, diz que os Assassinos a aguardam em Alexandria para a continuidade do trabalho, e a trama fica em aberto. Sem dúvida, Layla voltará em breve, talvez com Bayek e Aya ou descendentes diretos. Finalmente o senso de continuidade e trama convergindo a um ponto maior voltam a AC - algo perdido do Black Flag em diante.

- O que achei interessante também na trama, como historiador, foi, além de participarmos de acontecimentos históricos relevantes (levar Cleópatra enrolada num tapete a Júlio César, o cerco de Alexandria, e até matarmos o próprio César em Roma), a impressão correta de passado longínquo que os egípcios tinham de si mesmos em 48 a.C. Sendo uma civilização cujas origens remetem para além de 4000 a.C, as pirâmides de Gizé erguidas em 2500 a.C., aos moradores da região tais vestígios já eram de uma civilização antiga e milenar, assim como a época do jogo é a nós hoje. A temporalidade é muito bem trabalhada e ver o conflito em Bayek, um homem religioso e tradicional, entre inovação e costume, revolta ou submissão à ordem, é muito interessante. Uma das trajetórias mais bacanas de acompanhar em qualquer Assassin's Creed.

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Enfim, jogo primoroso, com inovações não 100% agradáveis, mas muito bem feito e que resgata as boas impressões que a série causava em seus primeiros jogos, e que se perdeu com a saturação de tantos títulos anuais e bugs. Com certeza um game indispensável, seja a entusiastas de História (a professores, eu diria ser obrigatório, hauahaua), fãs da franquia meio desiludidos ou não com os títulos recentes, ou simplesmente apreciadores de jogos de mundo aberto dispostos a se aventurar por um mundo rico e aprender muita coisa pelo caminho.

Diante de uma série de altos e baixos, que se satura e se renova, a Ubisoft reforça a velha máxima: nada em AC é eterna verdade. Tudo é permitido.  

GOLDFIELD - Nerdices e análisesWhere stories live. Discover now