Capítulo 49 - Tarde Explosiva

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– Os prognósticos são os melhores – eu afirmava, empolgada, no banco de trás do táxi em que nos dirigíamos à praia deserta para testar uma fórmula nova que Gruber vinha desenvolvendo para seus explosivos.

Era dia de semana, e só tínhamos conseguido um camarada taxista para nos levar até o local desejado, então nos espremíamos no banco de trás eu, Astrakhanov, Martins, e Francisco Romero, o assistente de Gruber, que, por sua vez, ia no banco do carona. A sorte era que Romero era um rapaz magriço, e conseguiu se acomodar entre os dois outros grandalhões; eu, porém, acabei tendo que me sujeitar a ir no colo do tenente.

Ele parecia um pouco sem jeito com a situação, mas eu ainda estava tão empolgada com o comício da ANL no sábado anterior que nem me importei. Equilibrei-me na ponta dos seus joelhos, e ia agarrada à almofada de cabeça, falando na orelha do pobre motorista. Narrei os discursos, as expressões dos oradores, acrescentando para os estrangeiros observações com o que eu sabia de suas biografias, no que fui ajudada por Martins.

– Sim, sim, os prognósticos são os melhores – eu reafirmei, por fim. – Não só porque pessoas importantes estão se levantando pela causa, mas principalmente por a população ter se interessado. Quando eles questionaram se alguém queria aderir à Aliança, surgiu uma fila quilométrica. Nós fomos embora assim que deu espaço, mas imagino que devem ter ficado até de madrugada anotando os nomes.

– Vocês não se filiaram, não é? – Gruber perguntou, alarmado. Pela cara de Martins, ele não via nada de errado com eu e "Stuart" nos alistarmos nas fileiras da ANL, mas antes que pudesse manifestar sua opinião, eu respondi ao austríaco:

– Não, não. Se for o caso, no futuro... Mas como Altobelli não disse que devíamos...

– Não vamos deixar nossos nomes escritos em lugar nenhum, a menos que seja estritamente necessário – Astrakhanov sumarizou. Gruber acenou aprovação, e Martins pareceu finalmente entender nossos motivos.

A essa altura, já nos encontrávamos na estradinha de terra que saía da principal, e guardamos silêncio pelo resto do caminho, os homens provavelmente gratos por terem um momento para colocar a cabeça em ordem, depois da avalanche de informações que eu despejara sobre eles. Saltamos todos, e dessa vez ninguém ficou na estrada, a não ser o próprio motorista, que ocultou o carro no mato marginal, enquanto nós descíamos pela trilha já conhecida.

– Aqui não – Gruber disse, quando chegamos lá embaixo. – Preciso de uma superfície para juntar os ingredientes.

– Lá tem uma pedra lisa que vai servir – Romero interveio, apontando na direção da parede de rocha, mais especificamente para as grutas que tínhamos visto no outro dia.

Com alguma dificuldade, galgamos a muralha rochosa até a abertura da gruta maior. Cada um carregava um pacotinho com alguns dos ingredientes, para evitar que se chocassem, se estivessem todos com a mesma pessoa, causando uma detonação acidental. A própria rocha formava uma escadinha natural íngreme que nos ajudou a atingir a caverna. Romero ia nos guiando, com Gruber a segui-lo e eu adentrei a gruta logo atrás de Martins. Astrakhanov fechava a procissão.

O lugar era espaçoso até; um andarilho exótico que resolvesse se isolar do mundo encontraria ali um bom lar. A pedra a que Romero se referira ficava bem perto da porta, era alta, comprida, e se assemelhava a uma mesa ou um daqueles altares antigos, me fazendo questionar se a caverna era obra da natureza e do tempo, ou alguma tribo indígena a entalhara para um uso a essa altura desconhecido. Qualquer que fosse o caso, servia perfeitamente aos nossos propósitos.

Gruber estendeu um jornal no chão, ao lado da mesa de pedra, e depositou ali seu pacote com as granadas preparadas com a mistura dele, que continha menor quantidade de ácidos e peróxido de hidrogênio do que o necessário para a receita original. Romero colocou sobre o jornal dois ou três cartuchos de dinamite militar, mechas e detonadores, e da mesma forma o resto de nós depositou ali os ingredientes que vínhamos trazendo.

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