Capítulo CXXXV

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Minha mente vagueava sem rumo, perdida em um labirinto de pensamentos dispersos. Embora as palavras de Rodrigo preenchessem o espaço confinado do carro, elas mal encontravam eco em meu universo interior, como murmúrios perdidos na brisa. De repente, o alvoroço das ruas do centro invadiu o silêncio, quebrando minha desconexão momentânea. Intrigada, meus olhos se fixaram automaticamente na janela, ansiosos por decifrar os acontecimentos que se desenrolavam no movimentado calçadão.
Enquanto minha mente processava a cena, avistei dois indivíduos em desesperada fuga pelo calçadão, agarrando bolsas consigo. Sem titubear, dirigi-me a Rodrigo e ordenei:
— Segue eles!
Rodrigo acelerou, mas logo nos vimos bloqueados pela multidão densa de vendedores e clientes, que se aglomerava diante da viatura, impedindo nosso avanço.
Decidi agir por conta própria:
— Eu seguirei a pé. Dê marcha à ré e dê a volta pelo quarteirão. Mantenha contato pelo rádio.
— Tem certeza de que conseguirá acompanhá-los? – Rodrigo parou o carro, preocupado.
— Tenho. – respondi decidida, desembarcando e avançando em direção à calçada. Com destreza, esquivei-me das pessoas e das barracas dos ambulantes, correndo o mais rápido que minhas pernas permitiam.
Com a determinação impulsionando cada passo, eu perseguia os assaltantes através do emaranhado de ruas e becos do centro da cidade. O calor da perseguição pulsava em minhas veias, alimentando minha determinação de capturá-los. Enquanto isso, Rodrigo me mantinha atualizada sobre sua localização, navegando a viatura pelas ruas adjacentes, em busca de uma rota que o possibilitasse interceptar os fugitivos.
A adrenalina pulsava em meu corpo enquanto eu avançava, mantendo os criminosos à vista. A cada esquina virada, a cada obstáculo superado, eu me aproximava mais e mais deles. O som dos meus próprios passos ecoava no ar, mesclado com a respiração acelerada e o pulsar acelerado do meu coração.
Quando os assaltantes se embrenharam por um beco estreito, aumentei minha velocidade e os alcancei justo quando estavam prestes a desaparecer da minha vista, pulando os muros do fundo de um estabelecimento. Com determinação, saquei minha pistola e a apontei na direção deles.
— Parados! Mãos para cima, agora. – ordenei, com a voz firme.
Um dos assaltantes hesitou por um momento, tentou escapar, pulando na direção do muro.
— Eu disse, parem! – gritei.
— Calma aí, moça. – disse o homem que havia hesitado, virando-se em minha direção com os braços para cima, enquanto as bolsas que segurava caíam no chão.
— Algo me diz que vocês não pagaram por essas bolsas. – comentei, mantendo um olhar atento no outro homem, que permanecia de costas. Percebi seu movimento em direção ao cinto. — Se eu fosse você, não faria isso, a menos que queiram antecipar seu funeral. – pedi reforço pelo rádio, enquanto mantinha a pistola apontada para os assaltantes. — Rodrigo, estou em um beco, cerca de 200 metros do fim do quarteirão. Encontrei os fugitivos.
Enquanto mantinha os assaltantes sob controle, ouvi o som da viatura se aproximando. Rodrigo chegou rapidamente ao local.
— Você deve ter sido uma atleta na escola, não? Corre pra caramba! – comentou Rodrigo ao se aproximar de mim.
— Na verdade, corro todas as manhãs. – respondi, sorrindo.
— Pensei que você estivesse enferrujada por passar tanto tempo numa cidade pequena, mas acho que quem está enferrujado sou eu. – brincou Rodrigo, dirigindo-se a um dos assaltantes. — E aí, amigo? Bolsas femininas são sua especialidade? Talvez eu deva providenciar pulseiras prateadas para combinar com seu estilo. — provocou, com um sorriso divertido.
— Ele vai ganhar pulseiras prateadas e um quarto VIP na delegacia. – comentei, guardando minha pistola e pegando as algemas. Logo me dirigi ao outro homem.

***

Ao final do dia, recebi uma ligação de Sarah enquanto aguardava Rodrigo sair de uma lanchonete. Atendi o celular.
— Alô?
— Oi, Sra. Policial, tenho uma ocorrência para você. Traga a algema e a pistola. – disse Sarah, com um tom brincalhão. Sorri.
— Sobre o que é?
— Abandono. Minha namorada me deixou sozinha. Pode convencê-la a voltar para mim?
— Deve haver um motivo para ela sair, mas tenho certeza de que ela vai voltar. Só precisa de um tempo. – respondi.
— Sério mesmo? Você pode garantir isso?
— Sim, tome um banho relaxante e coma algo.
— Amor, vem logo. Estou cheia de saudades. – pediu Sarah. Avistei Rodrigo retornando com sacolas para a viatura.
— Estarei aí em breve. Tchau. – encerrei a ligação antes que Rodrigo voltasse ao carro.
— Não tinha o refrigerante que você queria, mas peguei um de laranja. – disse ele ao sentar no banco do motorista.
— Tudo bem. – guardei o celular no bolso da calça.
— Estava falando com alguém?
— Sim. – respondi, sem entrar em detalhes. — Esse hambúrguer é realmente bom?
— Sim, como uns três por semana. – disse ele, oferecendo-me um dos lanches. — Pedi molho extra para você. Pode comer sem preocupações. É bom.
— Ok. – abri o pacote e mordi o sanduíche, percebendo o olhar de Rodrigo sobre mim.
— E então? Gostou?
Acenei afirmativamente com a cabeça.
— Suculento.
— Suculenta é a atendente. – brincou ele. — Pena que ela já tem namorado.
— Hm.
— Você está comprometida, Ema? Tenho amigos solteiros, posso passar o número deles. Gosta de loiros ou morenos?
— Mulheres. – respondi.
— Uau... Você é do meu time? – brincou ele após a surpresa.
— Digamos que sim. – abri a lata de refrigerante de laranja.
— Está na cidade há pouco tempo? Já conheceu alguém?
— Sou comprometida. – respondi.
— Ela faz o quê? É policial como você? – Rodrigo me observava enquanto comia.
— Advogada.
— Sério? Conheceu em uma delegacia?
— Não, em uma ocorrência em um motel. – respondi. Rodrigo franziu a testa.
— Tipo, ela estava com outra pessoa?
Acenei afirmativamente com a cabeça.
— É uma história complicada, prefiro não falar sobre isso.
— Tranquilo. – Rodrigo mordeu o hambúrguer dele e olhou para fora da janela. Respirei fundo, pensando em Nicolas. Ele mal podia imaginar o tamanho da confusão em que estava metido.
— Rodrigo, será que podemos passar na Moonlit Mirage? – indaguei, preocupada.
— Quer dar uma olhada nas meninas de lá? – perguntou ele.
— Não, quero rever um amigo.
— Olha, Ema. O Tony não vai ficar feliz de ver a polícia por lá.
— Ainda sente algo pela sua ex?
— Poxa, Ema... você tá cutucando minha ferida. Até choro pensando naquela mulher. – confessou ele. — Mas ela não me quer mais.
— Você a machucou ou a traiu?
— Não a valorizei. Sabe como é? Só valorizamos quando perdemos. – ele embrulhou o resto do lanche e guardou no pacote. — Acho que nada faria ela voltar para mim.
— Já pensou em colaborar com a irmã dela?
— Catarina? Ela não vai muito com a minha cara. E ela tinha razão em não gostar de mim. Eu fui um idiota.
— Não posso te obrigar a me ajudar, mas sabe como funciona a parceria? Tinha um parceiro antes de você, o Nick. Ele é como um irmão para mim. E ele está apaixonado por uma garota que trabalha para o Tony. E estou com medo de ele se dar mal, entende?
— O pessoal do Tony é da pesada. Eles matam, sabia? É bem arriscado mexer com eles. Seu amigo tem que sair de lá antes de fazer uma grande bobagem e acabar morto pelo Tony ou... Pela gente. – disse Rodrigo.
— Pela gente? – franzindo a testa.
— Sim, os capangas do Tony são audaciosos. Eles não respeitam ninguém. Trocam tiros e abusam da sorte, e vez ou outra acabam mortos. O Tony vive contratando seguranças novos. E não é porque o anterior se aposentou.
— Parece que você sabe mais coisas do que me contou. – falei intrigada.
— É... Uma vez, dormi na casa da minha ex e ouvi a irmã dela falando ao telefone na cozinha. Ela estava trabalhando até tarde. Parece que ela estava tentando se infiltrar na casa do dono da boate para conseguir provas que mostrassem a lavagem de dinheiro.
— Sabe se ela conseguiu? – indaguei.
— Deve ter conseguido. – disse Rodrigo. — Mas pelo visto não obteve provas, porque nenhum figurão foi preso.
— Talvez ela ainda esteja reunindo as provas. – comentei.
— É, pode ser.

DOMINADORA POR ACASO (Sáfico)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora