Retirei a máscara e a depositei na bancada, a noite parecia pouco promissora. Enquanto bebia meu drink, observei as pessoas ao redor, as vozes se misturavam à música suave e risos. Ao pedir o segundo drink, uma mulher loira sentou ao meu lado.
- Eu pago pra você. - disse ela, com uma máscara menor que deixava os olhos e a boca expostos. Ao contrário da maioria, vestia jeans e jaqueta.
- Quem é você? - indaguei, olhando para ela.
- Podemos falar o nome verdadeiro aqui?
- Sim.
- Norman. - ela estendeu a mão, revelando anéis, um deles em forma de cabeça de caveira.
- Sarah. - apertei a mão dela.
- Está sozinha?
- Não, mas se refere ao meu status de relacionamento, sim, estou sozinha. - respondi.
- Você está exibindo o rosto. Alguém pode te reconhecer fora daqui. - alertou Norman, fazendo-me sorrir.
- Não tenho problema em ser reconhecida. E você? - levei o copo até a boca.
- Tenho, meu pai é político. - revelou ela.
- Hm. - coloquei o copo na bancada. - Você é do time das filhas de políticos. Eu também sou. Vivo minha vida alheia a isso. Não deixo a escolha do meu pai afetar minha vida.
- Como faz isso? Eu nem posso respirar direito sem meu pai ameaçar me mandar pro fim do mundo. E ele é apenas o prefeito de Santa Mônica.
- Você depende de mesada, Norman? - levantei-me. - Melhor não gastar seu dinheiro comigo. Economize o dinheiro dos contribuintes. - pisquei antes de sair.
- Ei. - Norman me seguiu. - Você é dominatrix?
- Não. - olhei para ela. - E você?
- Eu sou.
- Sério? - cruzei os braços. - Não parece. Você precisa transmitir segurança e aprender a se impor. Tem um longo caminho pela frente. - voltei a andar, misturando-me às pessoas do saguão. Decidi ir para a área externa, onde peguei a chave do meu carro com o manobrista. Ao ligar o veículo, dirigi rumo à minha casa, contemplando as luzes da cidade.
Ao estacionar em frente ao meu imóvel, notei a presença de outro veículo parado. Pela placa, identifiquei que se tratava do carro do meu pai. Uma mistura de surpresa e apreensão tomou conta de mim.
Entrei em casa e deparei-me com meu pai no sofá da sala. Seus olhos deixaram o celular de lado ao me ver.
- Onde estava?
- O que disse para minha funcionária? Por que proibi sua entrada. - questionei ele.
Meu pai levantou-se. Seu terno preto cobria a camisa azul marinho, combinando com a gravata. Seus cabelos escassos revelavam a calvície herdada de seus antepassados. Um par discreto de óculos repousava sobre seu nariz, e sua barba estava impecavelmente aparada.
- Isso importa? Eu sou seu pai. E entro na sua casa quando quiser. - declarou, dando passos em minha direção.
- Posso fazer um boletim de ocorrência contra você. Não pode entregar na minha casa sem minha autorização.
- Sabe o que vão dizer sobre você ao descobrirem os lugares que frequenta? - indagou meu pai, com conservadorismo.
- Que sou depravada? E daí? Eu ligo. - rebati.
- Você poderia evitar polêmicas com o meu sobrenome? Eu sou uma figura pública. E ultimamente tenho gastado dinheiro para evitar que você prejudique minha carreira com um escândalo.
- Isso é irônico, pais mudam de endereço, mas são todos iguais. Conheci a filha do prefeito de Santa Mônica. Ele também é antiquado.
- O que disse? - meu pai estreitou os olhos.
- Sobre o quê?
- O prefeito de Santa Mônica. Eu o conheço. Ele me devia um favor, cobrei enviando a cretina que matou seu primo para lá. Ele me garantiu que ela vai passar o resto da vida naquele fim de mundo.
- Não pode deixar a moça em paz? O Alex estava perambulando pela cidade completamente drogado. Se estivesse sóbrio, não teria sido enquadrado pela polícia.
- Está defendendo quem contribuiu para o assassinato do seu primo?
- Não. Digo que você e tia Diana deveriam seguir em frente. O Alex cavou a própria cova. Aceitem isso. - dei passos em direção à escada. - Feche a porta depois de sair.
- Você está avisada, Sarah. Pare de frequentar aqueles lugares inadequados, vai arruinar sua carreira. Quem respeitará uma advogada que age como uma maníaca sexual? - meu pai me seguiu até a escada.
- Que tal irmos amanhã a um cartório e tirarmos seu nome da minha certidão de nascimento? Assim, para de encher meu saco. - apoiei-me no corrimão e olhei para meu pai.
- Quando se tornou essa pessoa vulgar?
- Bem, pai, posso ser vulgar, mas ao menos tenho a consciência tranquila. Nunca matei ninguém, ao contrário de você, né? - alfinetei.
- Cale a boca, Sarah! Você não sabe de nada. - disse ele.
- Tem certeza, pai? Praticamente me obrigou a defender o cara que matou o policial que enquadrou o Alex. Lembra disso? Existe algo chamado sigilo profissional, que me impede de revelar informações confidenciais sem o consentimento do meu cliente. - aproximei-me dele, encarando-o. - Eu sei que você pagou 25 mil pela execução. Como pôde orquestrar o assassinato de alguém?
- Meu único arrependimento é não ter dobrado o valor e dado um fim na parceira dele.
- Você é um monstro. - respirei fundo. - Quando te pegarem, esqueça o número do meu escritório. Darei ordens expressas para nenhum advogado associado a ele te defender.
- Você não vai me impedir de eliminar a última peça solta. - meu pai se afastou, indo em direção à porta de saída.
- O que está planejando? - o segui para fora da sala.
- Melhor você não saber. - dava passos na direção do carro dele.
- Pretende matar a policial?
- O que acha? - olhou para mim antes de abrir a porta do carro.
- Não, pai. - aproximei-me dele. - Chega de mortes. Tente se redimir. Por favor, pare com essa sede por vingança. Isso vai acabar com você.
- Vou dormir em paz quando aquela mulher estiver enterrada a sete palmos.
- Não. - segurei a porta do carro dele. - Posso falar com ela, pai. Deixe-me tentar resolver isso dentro da lei. Se ela for culpada, consigo uma confissão e ela vai para a cadeia, mas se for inocente, você deixa ela em paz. - ofereci a mão. - Temos um trato?
- Ela é culpada.
- Pai, por favor, seja racional. - insisti.
- Faça o que desejar, Sarah. - ele entrou no carro.
ESTÁ A LER
DOMINADORA POR ACASO (Sáfico)
Short StoryEma, uma policial de uma pacata cidade, tem sua vida transformada ao se deparar com Sarah. A presença enigmática de Sarah não apenas surpreende Ema, mas a conduz a um universo inexplorado, onde as algemas não servem para prender criminosos, mas dese...