Capítulo CX

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(Sarah narrando)

Ao adentrar a cozinha, deparei-me com o espaço vazio, enquanto os garçons circulavam apenas entre o salão e o bar na casa de Mariana e Daniele. O som da música desaparecera, e eu servi-me de água em um copo da cristaleira. Tomando o primeiro gole, dirigi-me à mesa e, perdido em pensamentos, apoiei-me na parte traseira de uma das cadeiras. Só retornei ao momento presente ao ouvir passos se aproximando, para minha decepção, era Lina, e não Ema.
— Oi. – disse ela, aproximando-se. — Como está?
— Ótima. – respondi.
— Tem certeza? Acho que você e a Ema se desentenderam. – ela comentou, deixando claro que nos observara na pista de dança.
— Eu só fiz algo que ela não aprovou. – respondi. — Mas não se preocupe, Lina. Eu e Ema estamos muito bem. – bebi outro gole da água.
— Sarah. – Angelina colocou-se à minha frente e tocou meu rosto suavemente. — Deixei que ficasse com aquela pirralha do interior, eu sabia que era apenas um capricho seu. Até que você voltou para cá namorando outra pessoa. Você queria chamar a minha atenção? Pois bem, conseguiu. Eu quero você de volta.
— Me quer de volta?! – franzi a testa. — Você deve ter bebido além da conta, porque está imaginando coisas. Eu nunca fui sua.
— Você era minha quando estava em minha cama. – Angelina desceu a mão para meu pescoço e me olhou nos olhos. — Você e eu sabemos que a Ema nunca será uma boa dominatrix. Ela é fraca.
— Fraca? Eu me sinto bastante segura nos braços dela. – tentei me afastar de Angelina, mas ela segurou em meus braços com certa força.
— Confia cegamente em Ema? Aposto que agora mesmo ela está dando trela para “V”. – disse ela.
— O que fez? Mandou sua amiguinha dar em cima da Ema? – sorri ironicamente. — Está perdendo seu tempo. A Ema não é infiel. Ela é leal a mim, assim como sou leal a ela.
— Não confie tanto em alguém que você mal conhece.
— Tem razão, Angelina. Nunca deveria ter confiado em você. Olha como é rasteira como uma cobra. Esperou que eu ficasse sozinha para me abordar. O que planeja? Vai me agarrar à força? Se eu fosse você não faria isso, eu vou gritar e logo todos os convidados estarão aqui. Seus amigos do clube saberão o tipo de pessoa que você é. Você será mal vista.
— Grite. Isso só irá me deixar mais excitada. Lembra-se de quando você gemia em meu ouvido? Lembra da gente? – ela disse exibindo um sorriso malicioso.
— Eu passo meu tempo focada no meu trabalho e na minha namorada. Não penso em você, Angelina. – respondi.
— Não minta. – ela subiu a mão para meu queixo e aproximou nossos rostos. — Sei que ainda pensa em mim. Que se toca lembrando de como éramos boas juntas.
— É melhor você me deixar em paz. A Ema...
— Não vejo a Ema aqui. – Angelina me interrompeu.
— Já chega! Você está passando dos limites. Eu não sou sua propriedade. – tentei me afastar, mas Angelina segurou com firmeza em meu pulso. Puxei o braço e acertei o copo sobre a mesa, derramando a água.
— Pare com esse joguinho, Sarah. Isso já está me tirando do sério. – disse Angelina, subindo as mãos para meus ombros.
— Pare de me tocar! – reclamei, novamente tentei me afastar, mas desta vez, Angelina foi mais enérgica. Me empurrou contra a mesa e se inclinou na direção do meu colo, antes que eu pudesse gritar, sua mão esquerda tampou minha boca. Pressionei seus ombros, na tentativa de me desvencilhar. No entanto, fui levada para a despensa contra minha vontade. Esperneei e grunhi, ansiando por ajuda. E quando meu corpo se chocou contra algumas prateleiras, percebi que Angelina estava fora de si.

***

Daniele se despediu dos convidados, pedindo desculpas pelo fim precoce da festa, enquanto Ema tomava lugar ao meu lado. Seu braço esquerdo envolvia meus ombros, mantendo-me próxima a ela, enquanto minha cabeça descansava confortavelmente em seu ombro. Um turbilhão de emoções preenchia meu ser. As lágrimas ameaçavam escapar, e a angústia aumentava ao pensar na possibilidade de Angelina aparecer a qualquer momento. Entretanto, Mariana apareceu sozinha.
— Ema... – chamou Mariana, enquanto observava a troca de olhares entre elas. — Está feito.
Ema fez um sutil aceno de cabeça, mantendo o assunto em sigilo.
— Vou levar a Sarah para casa. – anunciou ela.
— Por que não ficam para passar a noite? – sugeriu Mariana.
— Tanto eu quanto Sarah preferimos nossa cama agora. – respondeu Ema.
— Está bem. – Mariana se aproximou lentamente, agachando-se em minha frente. Enquanto estendia as mãos, notei a vermelhidão na palma de sua mão direita. — Sarah, gostaria de te pedir desculpas. Fui imprudente ao defender Angelina. Permiti que ela permanecesse em nossas vidas. Lamento profundamente. – seus olhos encontraram os meus, revelando um choro contido. Mariana estava claramente afetada pela situação causada por Angelina.
Senti que palavras não seriam suficientes naquele momento, então abracei Mariana em silêncio, percebendo seu suspiro.
Daniele se aproximava, alheia à gravidade dos acontecimentos, vendo-me apenas como indisposta.
Ema guiou meu carro até em frente à minha casa em um silêncio pesado, claramente hesitante em abordar o assunto delicado que poderia me deixar desconfortável. Ao adentrarmos o meu lar, deixei meus saltos no corredor e me joguei na cama, agarrando um travesseiro para abafar meu choro. Todas as emoções represadas pareciam transbordar, deixando-me com a sensação de ser reduzida meramente a um objeto erótico.
Em poucos minutos, uma mistura de sons encheu o quarto. A voz potente de Whitney Houston ecoava nos alto-falantes do aparelho de som, causando-me estranheza. Virei-me, percebendo a presença de Ema perto da cama, que acabara de colocar o controle do som sobre a mesa de cabeceira.
— Você me concederia a honra desta música? – ela estendeu a mão direita, exibindo um pequeno sorriso no rosto. O gesto era inesperado, especialmente vindo de Ema. No entanto, não questionei. Segurei sua mão e ergui-me, ciente de que meu rosto devia estar com uma expressão semelhante à de um panda. Ema conduziu-me para um espaço desimpedido do quarto, e o efeito do seu corpo encostando-se ao meu foi anestésico. — Pise sobre meus pés. – sussurrou ela em meu ouvido. Obedeci. Apoiei minha cabeça em seu ombro, enquanto meus braços envolviam seu tronco. Fechei os olhos e senti-me nas nuvens quando Ema começou a mover-se lentamente. A melodia romântica invadia minha mente, e os braços de Ema ao redor do meu corpo transmitiam-me segurança e conforto.

DOMINADORA POR ACASO (Sáfico)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora