Capítulo XXI

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Adentrei a delegacia e encontrei Nicolas apoiado na parede, digitando algo no celular.
— Bom dia. – sorri para ele.
— Bom dia? O dia mal começou e já estou cansado. Nunca mais me faça correr em volta daquela praça, sua tirana. – ele reclamou.
— Não precisa agradecer. – ironizei, ao passar por ele.
— Pedroso tá aí.
— Quê? – virei para trás, surpresa. — Há quanto tempo?
— Uns 10 minutos. Vai lá falar com ele. – Nicolas guardou o celular no bolso dianteiro da calça.
— Vou mesmo. – andei em direção à sala do delegado e bati na porta antes de entrar. — Senhor, posso?
— Entra, Ema. – Pedroso me olhou, carrancudo. Fechei a porta atrás de mim.
— A minha suspensão acabou. Posso pegar minha arma de volta?
— Claro.
— Obrigada. – respondi. — Já posso ir?
— Você vai ficar fazendo o trabalho interno. O Nicolas vai patrulhar. – disse Pedroso.
— Por quê? A gente se revezava.
— Você se excedeu no motel. Como pôde causar um alvoroço? As pessoas andam dizendo que há um pistoleiro a solta. E você sabe que isso é culpa sua. Até as coisas se acalmarem, você não sai de dentro desta delegacia. Fui claro?
— Minha culpa? Eu só estava fazendo...
— Campos, pare. – Pedroso disse com firmeza. — Não me faça te dar outra advertência.
— Isso é algum tipo de perseguição? – indaguei com indignação.
— Você realmente tem dificuldade de obedecer ordens. – Pedroso se levantou da cadeira. — Vai me obedecer ou prefere receber outra advertência? Isso não pegará nada bem para você, e na primeira oportunidade será cortada da equipe. – o aviso soou em tom de ameaça.
— Entendi, senhor. – respondi a contragosto. — Posso me retirar?
— Vá... E frequente o motel apenas nas suas horas de folga. Do contrário, fique longe.
Sai da sala sem retrucar, sabia que seria inútil. Andei até a área externa da delegacia e me sentei em um dos degraus. Logo senti uma mão em meu ombro.
— Ei, tudo bem? – Nicolas sentou ao meu lado.
— Não. Eu estou sendo perseguida por fazer o meu trabalho. Isso não é justo, Nick. Eu deveria denunciar o Pedroso. – comentei.
— Você vai perder o trabalho.
— Sabia que nem posso mais sair da delegacia? Acha justo que o Pedroso faça isso comigo? – olhei para Nicolas.
— Ele vai embora e vamos nos reversar como fazíamos. Agora, esqueça isso. E me diga, cadê a rosquinha?
— Que rosquinha? – estreitei os olhos.
— Não passou na padaria?
— Não, a Sarah foi até minha casa de manhã.
— E?
— Nada, depois que ela saiu, me arrumei e vim para cá.
— Você passou na frente da padaria e não entrou para trazer a nossa rosquinha?
— Nossa rosquinha? Se enxerga, Nicolas. Você quer me vender por um pãozinho açucarado? – empurrei o braço dele.
— Eu te venderia por um pão francês, Ema. – Nicolas brincou.
— Você é muito idiota. – fiz careta, me levantando. — Vamos entrar.
— Calma, Ema. Os meus glúteos estão doloridos.
— Onde você andou quicando? – provoquei.
— Em lugar nenhum. Foi aquela corrida que me deixou com dor. – disse ele. — Nem pense em passar na minha casa antes das 8 horas da manhã na minha folga.
— Eu não sei se você percebeu, mas tinha uma mulher te observando.
— Tinha?
— Sim. – assenti com a cabeça.
— O que acha de corremos amanhã de novo? Talvez ela esteja lá. Dessa vez, vamos dar 8 voltas.
— E seus glúteos?
— Nem estão doendo tanto assim.
— O que estão fazendo? – Pedroso nos surpreendeu.
— Senhor. – Nicolas se levantou rapidamente.
— Eu já vou embora, tentem não arrumar confusão. – Pedroso desceu os dois degraus até o estacionamento.
— Tchau, senhor. – disse Nicolas. Entrei na delegacia sem me pronunciar. Nicolas logo me acompanhou.
— Será que ele ouviu nossa conversa?
— Para ele somos só dois idiotas mesmo. – comentei.

***

A tarde se desenrolou lentamente, marcada pela visita solitária de um idoso de 75 anos, que relatou o desaparecimento de seu cachorro. Nicolas acompanhou-o até em casa, descobrindo que o cachorro havia escapado pelo portão e já fora encontrado por um dos netos do idoso.
No início da noite, eu descansava em uma cadeira na recepção, com a cabeça apoiada na parede e os olhos fechados. Quando ouvi passos, mesmo assim, mantive os olhos fechados até sentir uma presença à minha frente.
— Sarah?! – falei ao abrir os olhos. Lá estava ela.
— Ah, estragou a minha surpresa. – Sarah se inclinou em minha direção e me deu um selinho.
— O que faz aqui?
— Pode sair por um momento? Pensei que pudéssemos jantar juntas.
— Pode sim. – disse Nicolas saindo da saleta onde costumávamos ficar.
— Oi, Nick. – Sarah sorriu para ele.
— Oi, Sarah. Como está?
— Bem. Prometo fazer a Ema te trazer uma sobremesa bem gostosa, tá?
— Isso seria ótimo. – Nicolas sorriu.
— Está pagando mais do que valho, segundo ele. Hoje de manhã, ele queria me vender por uma rosquinha. – me levantei.
— Ah, não, Nick. – Sarah estalou a língua, agitando a cabeça negativamente. — Ela vale ao menos um croissant.
— Só? Vocês são terríveis. – olhei de um para o outro.
— Eu não posso espalhar por aí que você vale mais que isso, pode aumentar a concorrência. – Sarah abraçou minha cintura, olhando para mim. — Preciso dizer, você fica mais bonita de uniforme.
— Impressão sua.
— Seria desacato à autoridade se minha mão entrasse na sua calça antes de chegarmos à minha casa? – Sarah indagou próximo ao meu ouvido.
— Não, mas prefiro que suas mãos fiquem no volante. – respondi.
— Que estraga prazer. – Sarah afastou o rosto, fazendo um pequeno bico.
— Não tenha pressa. – falei olhando para ela.
— É difícil não ter vontade de tirar sua roupa toda vez que te vejo. – disse Sarah esboçando um sorriso malicioso.
— Como eu queria ser uma lésbica para ter uma namorada como a Sarah. – Nicolas murmurou. Sarah riu.
— Tadinho, tá se sentindo sozinho.
— Muito. – Nicolas respondeu exibindo a feição de coitado.
— Não acredite nesse farsante, ele dá em cima de quase todas as mulheres da cidade. – comentei.
— Só das mães solteiras. – Nicolas disse preenchendo o rosto com um sorriso.
— Que fetiche é esse? – Sarah franziu a testa.
— São legais.
— Cresceu sem seu pai, Nick? – Sarah indagou.
— Sim, como sabe?
— Um palpite. – Sarah respondeu. — Vamos, Ema?
— Claro.

DOMINADORA POR ACASO (Sáfico)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora